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“Mal dos Trópikos”: a avalanche verborrágica de Makalister*

*por Luiza Mazzola

“A pintores e poetas sempre assistiu a justa liberdade de ousar seja o que for.” A frase do poeta e filósofo romano Horácio não é sobre o rapper Makalister, mas poderia facilmente ser: seu primeiro álbum é tudo menos simplório e nada menos que genial. O artista despeja parte de seu vasto léxico e de sua ampla bagagem cultural em uma enérgica e complexa avalanche verborrágica que inunda os ouvidos de seu interlocutor. São inúmeras referências artísticas e culturais que desafiam o easy listening, adornadas por versos essencialistas e acompanhadas por beats marcantes.

O álbum, gravado no Loopicotado e Polvo Roxo, com mix e master de Efieli, tem participações especiais de Matéria Prima, Aori, Jovem Esco, Luccas Carlos, Reis do Nada, Jeffe, Froid e Diomedes Chinaski. As 11 faixas que compõem o registro são ideias, reflexões, desafios, provocações, imagens, filmes e rimas que continuarão a ressoar intensamente no íntimo do ouvinte, propriedade típica das revoluções artísticas. Maka não deixa a desejar nem em forma nem em substância e suas reflexões hiperdesenvolvidas constituem um bombardeio cerebral incessante.

“Synedoche Linhas Pífias” é uma colcha de retalhos culturais lindamente costurada que reflete sobre a valoração da arte enquanto passeia pelas vivências individuais do rapper. A faixa “Linhas Abissais” é repleta de texturas e elementos que enriquecem de forma magistral a rima de Makalister, enquanto em “D.A.Z.A. City” é a cidade que se torna o mote do fluxo de seu dizer. A envolvente “Bobby James” conta com um sensual sample de “Summer Breeze”, e “Spice Girl”, embora mais curta que as demais, também contribui para uma atmosfera intimista, ambas perfeitas para se ouvir no escuro. Já a derradeira “Quando As Sombras Brilharem” fecha o álbum com uma irretocável união entre as rimas do gigante bruxo pernambucano Diomedes Chinaski e o rapper josefense.

Não seria exagero dizer que “Mal dos Trópikos” não tem sequer uma faixa mais ou menos, o jovem Maka cospe chama atrás de chama. Considerando que o todo é muito mais que a soma das partes, o registro precisa ser compreendido em sua totalidade, como produto artístico de um tempo e de um lugar. “Mal dos Trópikos” é uma porta aberta com violência para o entrelugar entre realidade e representação que torna a arte algo tão essencial e maravilhoso. Ao ouvir o álbum de estreia do artista e sua inegável e irrepreensível competência lírica, a questão que se coloca não é se ele está pronto para o público, mas se o público está pronto para ele. Makalister, lembrem desse nome.

*Luíza Mazzola é professora de francês, tradutora, revisora, doutoranda em Literatura na UFSC, mas antes de mais nada, amante da música

Daniel Silva é jornalista e editor do portal Rifferama, site criado em 2013 para documentar a produção musical de Santa Catarina. Já atuou na área cultural na administração pública, em assessoria de comunicação para bandas/artistas e festivais, na produção de eventos e cobriu shows nacionais e internacionais como repórter de jornal.

4 Comentários

  1. Já disse pro Dani, e vou reafirmar publicamente, as tuas resenhas me estimulam e me cativam. A forma como você se joga atrai o leitor.

  2. Muito boa resenha, Luíza! Não conheço e fiquei bem a fim de ouvir!

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