“Não tem IA”: Na contramão, UmQuarto lança álbum imperfeito

O terceiro álbum da UmQuarto, “Fora de lugar”, divulgado no dia 28 de outubro nas plataformas digitais, chegou com a promessa de que, agora sim, a banda revelaria o seu verdadeiro som. Muito pela contribuição dos outros integrantes, que além de escrever, também cantam. “Apenas” (2021), o primeiro registro, é o mais redondo deles, mas pouco aventureiro, sem explorar toda a bagagem musical de Mayer Soares (voz e baixo), principal compositor do grupo, que começou como um projeto solo seu. A UmQuarto já foi trio e mudou toda a formação com um disco pronto — entraram Rafael Salib (guitarra), Bernardo Flesch (teclas) e Rafa Nogueira (bateria). “O meio do caminho” (2023) teve gravações adicionais dos novos integrantes, resultando em um aprimoramento do material que já existia, mas ainda não era aquilo que uma banda que se assumia psicodélica ou progressiva, e com esse potencial, poderia fazer.

“Eterno, enquanto quase” confirma a expectativa. Com seus mais de sete minutos de duração, uma escolha ousada para abrir um álbum, a faixa, que tem assinatura dos quatro músicos, tem um riff cíclico, que se repete, trocas de andamento, passagens acústicas e harmonias vocais caprichadas, marca registrada desse material. Outro ponto que faz “Fora de lugar” ser diferente é que a UmQuarto optou por não usar metrônomo na gravação, que foi realizada no Bárbaro Estúdio, em Florianópolis, com produção de Felippe Pompeo, o quinto elemento, mixagem do próprio Mayer Soares e masterização de Alexei Leão. A decisão por fazer o disco ao vivo, com todos tocando juntos na mesma sala, trouxe uma sonoridade mais orgânica, enfatizando os pontos positivos e as imperfeições, indo na contramão dessa busca por uma perfeição inatingível.

A participação de Salib, Flesch e Nogueira também refletiu na diversidade do repertório. “O roxo e o verde”, primeiro e único single do disco, de autoria do guitarrista, conhecido pelo seu trabalho no blues, entregou alguns dos momentos mais diferentes do repertório. Além do single, que apresenta uma sonoridade vintage, com teclados em evidência e ecos de Steely Dan, “Farinha Lima” surpreende pelo peso e psicodelia, mas também pela sessão jazzística e mais: sem se preocupar com padrões, a banda parece se divertir tocando, criando tensão para retomar o riff cavalar da introdução. “Fora de lugar” tem muitos destaques. A sintonia entre os integrantes e a divisão dos vocais, fazendo com que o álbum soe dinâmico, são os mais óbvios. Tem melancolia, tem crítica, tem humor e “Sobre o voo”, possivelmente a melhor canção já lançada sob o nome UmQuarto. Cabe citar que Mayer evoluiu bastante como intérprete desde o primeiro registro (a volta para o último refrão é redentora). 

A música que batiza o álbum mostra o quanto a banda cresceu com essa formação. Ritmo frenético, a exemplo da faixa de abertura, quase como uma jam de 11 minutos e meio, tempero regional, melodias que se repetem (motifs), efeitos nas guitarras e teclados… é rock progressivo do bom. “Fora de lugar” inaugura essa nova fase da UmQuarto, mais solta, mais criativa e menos formulaica. Sem pensar no mercado fonográfico, o grupo tentou captar o melhor som possível, com poucas correções, se arriscando mais e colheu frutos. O instrumental está mais elaborado, o grupo soa como se estivesse tentando fazer diferente, dar o máximo. E é isso o que vale. O resultado não é perfeito, e esse era o objetivo mesmo, soar como humanos. “Não tem IA”, como diz a faixa título. A UmQuarto é uma banda de verdade e sempre promete fazer melhor no próximo trabalho. A ver.

O show de lançamento de “Fora de lugar” acontece na próxima quinta-feira (13), no TAC (Teatro Álvaro de Carvalho), dividindo o palco com Lupino, que também apresenta o seu novo trabalho, “Esquinas”. Ingressos